terça-feira, 26 de julho de 2011

Entrevista: Beto Pandiani


Roberto Pandiani, santista, 53, há 16 anos realiza expedições de alto desempenho pelos mais temidos mares do mundo a bordo de catamarans sem cabine. Filho do também velejador italiano Corrado Pandiani, conquistou prêmios nacionais e internacionais e coleciona marcos vitoriosos na história da vela mundial. No final dos anos 90 deixou a área de entretenimento e assumiu a vela como profissão e negócio, passando a trabalhar exclusivamente com o esporte que é a paixão de sua vida.

As expedições de Roberto Pandiani originaram quatro títulos pela Editora Terra Virgem: Rota Austral, Travessia do Drake, Rota Boreal e o recente Entre Trópicos. Em 2008, foi lançado um DVD da primeira parte da Travessia do Pacífico, e, agora em 2009, será lançada a segunda parte. Em julho de 2009 foi lançado o primeiro livro de histórias, O mar é minha Terra. Atualmente, tem ministrado palestras sobre planejamento, gerenciamento de risco, superação de resultados e trabalho em equipe para grandes empresas.

Vicente Morisson: Como se deu a influência da vela na sua família e depois com você?
Beto Pandiani: Meu pai foi velejador na Itália quando ele era jovem. Ficou registrado isso em mim, mas também sempre tive afinidade com o mar. Nasci em Santos.

VM: O que lhe fez mudar da vida de empresário de grandes casas noturnas de São Paulo dentre outros negócios para se dedicar exclusivamente ao mundo da vela?
BP: O sonho de viajar pelo mundo, qualidade de vida, natureza e a atração pelo desafio, o inesperado e a vida mais simples.

VM: As suas expedições a vela se caracterizaram por navegações feitas com catamaran (embarcação composta por dois cascos e sem cabine). Por qual motivo você optou por esse tipo de embarcação? O que lhe encanta num catamaran?
BP: Minha vida como velejador começou correndo regatas de Hobiecat 16, um pequeno catamaran bem rápido. Depois veio a idéia de viajar em outro catamaran um pouco maior, de 21 pés. A idéia era que um barco como este chegaria a praias que outro barco não chegaria. Coisa que só um barco com pouco calado.


VM: A espiritualidade tem alguma importância na sua vida? Caso sim, o que ela representa para você?
BP: A questão espiritual eu vejo de uma maneira bem própria. Me parece que hoje em dia existe muito turismo espiritual, que é um modismo em teorizar pensamentos, acho válido, pois vejo que é esta surgindo uma consciência nova. Outro aspecto é a separação da vida em material e espiritual. Não consigo ver assim, para mim tudo é espiritual, a vida aqui não pode ser vivida com separação, pois a nossa experiência é no plano físico.

VM: Você tem algum tipo de prática pessoal, como yoga, meditação, etc? Caso sim, qual (is)?
BP: Medito e procuro estar atento a tudo o tempo todo. Estar consciente com os acontecimentos na minha vida.

VM: Imagino que nesse seu histórico de grandes expedições (“Entre Trópicos”, “Rota Austral”, “Travessia do Drake”, “Rota Boreal”, “Travessia do Pacífico”) você já enfrentou algumas situações de risco no mar? Caso sim, como lidou com elas?
BP: Sim, no mar assim como na vida estamos sujeitos a todos os imprevistos. Chamaria isto de imponderável. Aprendi que o imponderável pode ser a nossa oportunidade. Bons marinheiros se formam em mares duros.

VM: Como a sua mente se comporta nesses momentos de dificuldade? Como você faz para mantê-la sob controle?
BP:
Quando uma situação de risco se apresenta eu procuro me concentrar no problema a ser resolvido. Se for uma situação de risco sem nenhum acidente por exemplo, tento também manter o foco no barco, me concentrar ao máximo e procurar mentalizar nós conseguindo chegar onde devemos chegar. É bastante difícil.



VM: Você tem medo da morte? Como a encara?
BP: Não tenho medo de morrer, tenho medo de morrer sem fazer o que tenho que fazer. Encaro a vida como uma viagem no meu barco a vela. O barco é a alma que não para nunca, esta sempre em movimento, e o mar simboliza o emocional, onde o barco navega. Na tempestade, na calmaria ou com vento a favor somos obrigados a aprender a lidar com estas situações, ou que atraímos ou que são inerentes desta natureza.

VM: Você leva algum tipo de experiência do mar para o seu dia-a-dia? Qual (is)?
BP: Sim, acho que respondi esta pergunta na anterior.

VM: Como é dividir o barco com uma outra pessoa, no caso, o Igor Bely? Qual é o segredo para não perder a sintonia?
BP: Vejo que o segredo não é perder a sintonia e sim encontrá-la. Começa antes, na preparação, quando começamos a nos relacionar durante a fase de preparação. Procuramos focar no prazer de fazermos juntos, no bom humor, em compartilhar tudo com respeito. Não somos nada sérios, mas trabalhamos com responsabilidade. A nossa sintonia é o respeito e admiração mutuo que temos um pelo outro.


VM: Quem são as suas grandes referências no mar e fora dele?
BP: Amo o vento, pois é algo que não vemos mas sentimos. O espírito de equipe, a solidariedade, a intuição que você desenvolve são alguns dos elementos que viraram referência para mim.

VM: Você faz algum tipo de dieta especial e acompanhamento nutricional seja ele no dia-a-dia ou focado para alguma expedição?
BP: No dia a dia procuro comer de maneira saudável. No mar temos que comer o nosso cardápio que é bem diferente do dia a dia. Barras energéticas, comida liofilizada, coisas bem calóricas.

VM: Como você vê a relação do homem e o mar hoje em dia? Se há alguma conseqüência negativa ou positiva visível quais seriam elas?
BP: Ainda vejo que o homem esta muito afastado do mar, principalmente, no Brasil. Muitas pessoas sentem medo por não conhecer. Talvez até porque o mar simbolicamente são nossas emoções. Não sei se tem muita gente querendo mergulhar profundamente no oceano de dentro. Falando da preservação, nossos oceanos estão sendo devastados pela pesca predatória e pela poluição. Um cigarro que é jogado no chão vai para o mar. Então é só andar na rua e observar. Estamos bem distantes de nós mesmo. Mas sou otimista e vejo que existe muita gente que pode despertar.

VM: Qual o lugar mais especial que você já navegou?
BP: Não consigo escolher um, mas já que tenho que falar escolho a Antártica.


VM: O que representa o mar para você?
BP: O mar é minha Terra, um lugar amplo, livre. Quando se veleja em mar aberto parece que tem poucas coisas para ver, mas se você prestar atenção descobre um universo nas sutilezas.

VM: O que você mais gosta de fazer nas horas vagas?
BP: Estar em casa com amigos, ler, cinema, e viajar de carro.

VM: Você atua em alguma causa social ou em defesa ao meio ambiente? Caso sim, qual(is)?
BP: Não estou engajado em nenhum movimento social ou de meio ambiente. O meu movimento é interno.

VM: Você poderia contar um pouco sobre como está sendo o processo do novo projeto da travessia da Ártico? Como é trazer isso para a prática? Como foi viabilizar as outras expedições e como está sendo viabilizar essa?
BP: Viabilização é um processo longo que requer paciência, estratégia, dedicação e muita autoconfiança. No primeiro momento você sonha e depois você entra no mundo do pragmatismo, onde o caminho de concretização exige muita energia.

O melhor treino e preparação de uma viagem não é fazer ginástica e ficar velejando na Ilhabela. O grande teste é vender e organizar. Preciso também de um ano no mínimo para interiorizar que me propus a fazer.


VM: O que você considera essencial para se viver bem?
BP: Ser feliz!

VM: Que dica você daria para quem está querendo começar a velejar?
BP: Difícil falar assim tão sinteticamente.

Travessia do Pacífico - Parte 4 - Ilha da Páscoa from Eduardo Teiman on Vimeo.


Mais informações sobre Beto Pandiani: www.betopandiani.com.br

domingo, 10 de julho de 2011

Vedānta x problema existêncial



É comum estarmos sempre correndo atrás dos nossos desejos na tentativa de nos preenchermos de alguma forma. Existem dois tipos de satisfação que são comuns entre nós: artha (segurança) e kama (prazer). Contudo, eles não duram muito. Sempre estaremos nesse jogo de ganhos e perdas na busca dessa satisfação. Se não tivermos a maturidade para entender ambos os lados de uma determinada situação estaremos sempre com uma sensação de insuficiência.

Assim, é importante aprendermos aceitar o resultado das nossas ações, já que o resultado está além do nosso comando. É importante saber relaxar e apreciar aquilo que recebemos como resultado das nossas ações, já que ele pode vir de 4 formas: acontecer exatamente o que prevíamos, acontecer a mais do que prevíamos, acontecer a menos do que prevíamos ou acontecer algo totalmente diferentes do que prevíamos. Mas parece que esquecemos dessas condições quando algo não acontece da forma como imaginávamos.

A insegurança que tenho não pode ser intrínseca a mim, pois ela vem e vai. Se não me libertar dos meus medos e condicionamentos ela continuará presente e me incomodando.


Contudo, quando consigo amar, por um momento, essa sensação desaparece. Por quê? Porque a pessoa que eu quero ser está centrada no Ser. Portanto, para nos livrarmos desse conflito a única solução é o conhecimento do Eu ou auto-conhecimento.

Mudanças acontecem a todo instante, já que nada é permanente e perfeito. Muitas vezes queremos que determinadas situações ou objetos não mudem. Isso é sinal de imaturidade. Enquanto não aprendermos a lidar com essa dança do Universo iremos ficar presos nessa roda e continuaremos sofrendo.

O que muitas vezes esquecemos ou não sabemos é que podemos ser felizes mesmo sem satisfazer os nossos desejos. Não há nada de errado em ter desejos até mesmo porque a insatisfação em relação aos desejos não conquistados é o que nos move em direção à algo, à agir.

O estudo do Ved
ānta, a parte final dos Vedas, nos aponta que aquilo que pode nos preencher já somos nós mesmos. Portanto, sou eu quem deve ser conhecido. Quem sabe eu não sou a solução do problema? Quem sabe os śastras (escrituras) não estão certos? Para isso, é necessário um meio de conhecimento específico chamado brahmavidyā (conhecimento do Ser), que é feito de palavras. Essas palavras quando cuidadosamente usadas apontam para aquilo que eu sou e são o meio de conhecimento. Alguém que seja qualificado pode nos mostrar esse espelho através do uso das palavras.

Olhar no espelho de Vedanta é olhar para si mesmo!